sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

josé soeiro.

o seu texto.
o caminho para mim.
simples. incisivo. marcante.

ano novo, vida nossa

bateram as 12 badaladas e anunciaram que tínhamos ficado em 2011. na televisão, um comentador explicava: "seria uma irresponsabilidade mudar de ano agora, em plena crise." o colega de debate, especialista em finanças cronológicas, concordava: "não estamos em tempo de comprar novos calendários, as pessoas têm de compreender que é preciso fazer sacrifícios."
claro que nem toda a gente aceitou pacificamente a ideia. milhares de jovens que iam fazer 18 anos em 2012 organizaram manifestações pelo direito ao futuro: "não queremos ficar com as nossas vidas congeladas", gritavam nas ruas. movimentos de cidadãos fizeram uma jornada contra o "recuo histórico" que significava voltar ao passado. houve uma greve por um novo calendário e por melhores condições de vida. clandestinamente, alguns começaram a produzir calendários alternativos e a funcionar com as datas de 2012. O governo explicou que era "totalmente inviável" mudar de ano. sugeriu que os jovens emigrassem. perante os protestos, ameaçou prender quem tentasse fazer um ano novo à revelia do acordo estabelecido com parceiros internacionais.
de repente, as praças foram ocupadas pela gente. fizeram-se músicas, contos, poemas, filmes sobre os futuros possíveis: como seria um ano novo? as pessoas começavam a criar aquilo de que falavam. aguentaram semanas na rua, numa lenta impaciência. Até que um dia o poder viu-se impotente: já não restava ninguém em 2011.»
josé soeiro
público 
[30.12.2011]

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